terça-feira, 30 de agosto de 2011

Sabedoria

Autor desconhecido

O velho Mestre pediu a um jovem triste que colocasse uma mão cheia de sal em um copo d'água e bebesse.

- "Qual é o gosto?" perguntou o Mestre.

- "Ruim " disse o aprendiz.



O Mestre sorriu e pediu ao jovem que pegasse outra mão cheia de sal e levasse a um lago.

Os dois caminharam em silêncio e o jovem jogou o sal no lago, então o velho disse:

- "Beba um pouco dessa água". Enquanto a água escorria do queixo do jovem, o Mestre perguntou:

- "Qual é o gosto?”

- "Bom!" disse o rapaz.

- Você sente gosto do "sal" perguntou o Mestre?

- "Não" disse o jovem.

O Mestre então sentou ao lado do jovem, pegou sua mão e disse:

- A dor na vida de uma pessoa não muda. Mas o sabor da dor depende aonde a colocamos.

Então quando você sentir dor, a única coisa que você deve fazer é aumentar o sentido das coisas. Deixe de ser um copo. Torne-se um lago...




sábado, 20 de agosto de 2011

Esta casa velha e um hobby


No patamar da escada, onde haveria uma porta no projeto inicial, ficou um baixo relevo na parede. Nunca prestara atenção nisso, até que precisei de um lugar para acomodar as imagens que restauro. Um hobby. Foi assim: chegava na secretaria da paróquia e via aquelas imagens quebradas, lascadas, descoradas ou mesmo em bom estado, largadas ali por pessoas supersticiosas que têm receio de jogá-las, ou por familiares de falecidos que, sem saber o que fazer com aquela herança, levam à igreja, achando que ali, elas pemanecerão para sempre.

Um dia perguntei o que era feito com elas. Destruídas e jogadas no lixo. Nesse dia havia por lá uma imagem bonita do S C de Jesus e outra do arcanjo Gabriel. Estavam lascadas. Tomei-as para mim e restaurei. Gostei de fazer aquilo e, de repente, eis-me com diversas imagens em casa, pois já não jogavam fora, mas guardavam para mim. Imagens de gesso, comuns, imagens de terracota, de madeira, porcelana, etc, peças que me proporcionam momentos de descontração em seu restauro.


Mas algumas são especiais. Uma era de dona Fulana, que a trouxe de Fátima e ao falecer, os filhos que não são lá dessas coisas, levaram à igreja. Outra pertencia à sogra de dona Sicrana, mas como não se davam bem, esta não quis guardar coisas da falecida. A Nossa Senhora Mãe de Jesus, grande, de pendurar na parede, assistiu a reuniões de algumas gerações de senhoras da igreja. Ao danificar-se, tiveram pena de jogá-la e ficou por anos guardada, até que souberam da minha mania e ma entregaram. E assim, junto com algumas dessas peças sem valor material chegam histórias que fazem com que elas se tornem providas de vida.

O lugar onde elas ficam chamo de "santário", não santuário, o lugar não é sagrado, nem oratório, pois o objetivo não é fazer dali um local de oração. Gosto do meu santário e de vez em quando paro ali e converso com as imagens sobre as mãos que as tocaram e as razões que as levaram aos lares por onde passaram.


terça-feira, 16 de agosto de 2011

Por causa dos caquinhos


Por conta do artigo “A história do piso de caquinhos das casas paulistas”, de autoria do Engenheiro Civil Manoel Henrique Campos Botelho, compartilhado no facebook pelo amigo Bilé Petroni, me emocionei e saí fotografando por aqui.


Nossa casa foi construída nos anos 48/49, pelo meu avô Luiz Walder, que em seu tempo tinha como profissão “construtor”, isto é, um pedreiro que além de levantar paredes e cobrir, acompanhava a obra na ausência do engenheiro e fazia de tudo na construção, até aqueles relevos artísticos nas fachadas. Nesta construção em particular, meu pai que não é do ramo, trabalhou com ele. Casa simples, que enfrentou várias enchentes e está firme.


Escrevo com o olhar do coração. Para a maioria ela será apenas uma casa velha, fora de moda, cujo valor se resume ao do metro quadrado do terreno. Para mim, é repleta de detalhes significativos, onde percebo o capricho dos que a fizeram.


O forro e o assoalho, planejados pelo meu avô e colocados por meu pai revelam arte e precisão. A escada feita manualmente pelo meu avô, de peroba, resiste aos cupins e me remete àquelas fotos da casa de Monet. As portas e fechaduras, ainda são originais, inclusive porta dupla, no quarto que dá para o corredor, o que facilita a movimentação dos móveis.


Temos uma saleta cujo piso é de cerâmica sextavada vermelha com bordas de caquinho, arte do meu avô. Já reformamos os banheiros, trocamos o piso de baixo, mas não tive coragem de mexer nesse piso.


Como disse no início, todo esse blá, blá, blá e as fotos que o ilustram aconteceram por causa do piso de caquinhos, mas foi muito bom revisitar cada um desses cantinhos, mergulhar no tempo e trazer à tona outras memórias. Aguardem-me.



terça-feira, 9 de agosto de 2011

Um dia inesquecível

Acho que foi na primeira vez que saímos juntas. Minha irmã Jussara, Marcela e eu. Íamos ao teatro, mas antes, passamos pela casa da Marcela e a trouxemos para um café. Ao dobrarmos a última esquina antes de casa, ela exclama animadíssima: “Nossa! Por aqui tem muito verde, e flores também, que lindo! Que árvores são essas?”.

Depois do café seguimos para o SESC Pompéia, onde assistiríamos a um espetáculo de dança. Não me lembro do nome, nem do espetáculo em si, tornaram-se insignificantes diante da companhia e da desenvoltura da Marcela.

Já estávamos bem próximo do endereço desejado, quando ao depararmo-nos com uma praça, minha irmã, a motorista, viu-se perdida e pensando em voz alta perguntou qual seria o caminho a seguir. Imediatamente a Marcela explicou que ela deveria seguir por tais e tais ruas, que daria certo. E assim foi.

Curiosas, perguntamos como poderia ela conhecer tão bem aqueles caminhos, sendo que a vida toda morou do outro lado da cidade e nunca estivera ali.

- Ah, é fácil. Quando o meu querido Palmeiras joga, fico ouvindo o rádio e os locutores orientam os motoristas, ensinando os melhores trajetos para desviar do trânsito e chegar ao Parque Antártica e um desses caminhos é justamente o que fizemos.

Na entrada do teatro, ela tocava encantada, o trabalho artístico feito em alto relevo e ao entrarmos na sala de espetáculo ela comentou:

- Que pena, veio pouca gente! Realmente ainda era cedo e a sala estava quase vazia.

A Marcela está com 25 ou 26 anos, estudou em escolas especiais, faz faculdade de música, compõe, toca diversos instrumentos, rege o coral da igreja que frequenta, apresenta-se em festas. Tudo sozinha, acompanhada apenas de sua bengala branca. Ah, esqueci! Ela é Deficiente Visual, nasceu prematura e nunca enxergou.

Se você leu até aqui, vai querer voltar ao início da narrativa que achou meio sem sentido, boba, não é?

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

O QUE É VIRTU@L?

(Desconheço o autor)

Entrei apressado e com muita fome no restaurante.

Escolhi uma mesa bem afastada do movimento, pois queria aproveitar os poucos minutos de que dispunha naquele dia atribulado para comer e consertar alguns bugs de programação de um sistema que estava desenvolvendo, além de planejar minha viagem de férias, que há tempos não sei o que são.

Pedi um filé de salmão com alcaparras na manteiga, uma salada e um suco de laranja, pois afinal de contas fome é fome, mas regime é regime, né?

Abri meu notebook e levei um susto com aquela voz baixinha atrás de mim:

-Tio, dá um trocado?

- Não tenho, menino.

- Só uma moedinha para comprar um pão.

- Está bem, compro um para você.

Para variar, minha caixa de entrada estava lotada de e-mails. Fico distraído vendo poesias, as formatações lindas, dando risadas com as piadas malucas. Ah! Essa música me leva a Londres e a boas lembranças de tempos idos.

- Tio, pede para colocar margarina e queijo também?

Percebo que o menino tinha ficado ali.

- OK, mas depois me deixe trabalhar, pois estou muito ocupado, tá?

Chega a minha refeição e junto com ela o meu constrangimento. Faço o pedido do menino, e o garçom me pergunta se quero que mande o garoto ir. Meus resquícios de consciência me impedem de dizer. Digo que está tudo bem.

- Deixe-o ficar. Traga o pão e mais uma refeição decente para ele.

Então o menino se sentou à minha frente e perguntou:

- Tio, o que está fazendo?

- Estou lendo uns e-mails.

- O que são e-mails?

São mensagens eletrônicas mandadas por pessoas via Internet.

Sabia que ele não iria entender nada, mas a título de livrar-me de maiores questionários disse:

- É como se fosse uma carta, só que via Internet.

- Tio, você tem Internet?

- Tenho sim, é essencial no mundo de hoje.

- O que é Internet, tio?

- É um local no computador onde podemos ver e ouvir muitas coisas, notícias, músicas, conhecer pessoas, ler, escrever, sonhar, trabalhar, aprender. Tem tudo no mundo virtual.

- E o que é virtual, tio?

Resolvo dar uma explicação simplificada, novamente na certeza que ele pouco vai entender e vai me liberar para comer minha refeição, sem culpas.

- Virtual é um local que imaginamos algo que não podemos pegar, tocar. É lá que criamos um monte de coisas que gostaríamos de fazer. Criamos nossas fantasias, transformamos o mundo em quase como queríamos que fosse.

- Legal isso. Gostei!

- Mocinho, você entendeu o que é virtual?

- Sim, tio, eu também vivo neste mundo virtual.

- Você tem computador?

- Não, mas meu mundo também é desse jeito... Virtual.

Minha mãe fica todo dia fora, só chega muito tarde, quase não a vejo.

Eu fico cuidando do meu irmão pequeno que vive chorando de fome, e eu dou água para ele pensar que é sopa.

Minha irmã mais velha sai todo dia, diz que vai vender o corpo, mas eu não entendo, pois ela sempre volta com o corpo.

Meu pai está na cadeia há muito tempo.

Mas sempre imagino nossa família toda junta em casa, muita comida muitos brinquedos de Natal, e eu indo ao colégio para virar médico um dia.

- Isto não é virtual, tio?

Fechei meu notebook, não antes que as lágrimas caíssem sobre o teclado.

Esperei que o menino terminasse de literalmente 'devorar' o prato dele, paguei a conta e dei o troco para o garoto, que me retribuiu com um dos mais belos e sinceros sorrisos que eu já recebi na vida, e com um 'Brigado tio, você é legal!'.

Ali, naquele instante, tive a maior prova do virtualismo insensato em que vivemos todos os dias, enquanto a realidade cruel rodeia de verdade, e fazemos de conta que não percebemos!



(Foto: SOS Criança de Rua)

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Guaraná ou Fanta?

Meus ouvidos parecem antenas parabólicas. De repente alguém por perto começa uma conversa e inevitavelmente escuto e, como na maioria das vezes o assunto é pitoresco, não tem como não registrar. Sem contar que minha memória auditiva é privilegiada, sempre foi assim, aprendia nas aulas, em classe, quase não precisava estudar.

Lembrei de uma, das muitas que tenho arquivadas, por conta da notícia do congestionamento na Brigadeiro Luiz Antonio.

Era dezembro, um calorão e eu em pé no coletivo. Na altura da Batataes (com “e”, como está na placa), o semáforo fecha e vejo o Ari Toledo saindo do flat onde morava. Camisa branca, tipo bata e um longo colar. Sorrio sozinha lembrando quanto ele já nos fez rir e cantarolo mentalmente aquele que foi o seu primeiro sucesso: “puxa vida não tinha uma vida pior do que minha meu Deus quanta moça que fome que eu tinha zanzando na praia pra lá e pra cá...”.

Gargalhadas vindas do fundo do veículo me trazem de volta ao presente e imediatamente me plugam na conversa animada de dois rapazes, e aí, o melhor!

Os dois trabalham em um laboratório de análises clínicas naquela região. Coletam material para exames. Um deles contava um causo do dia. Um cliente, que ele chamava de alemão, viera fazer um exame de sangue junto com a namorada. Quando a menina se ofereceu para acompanhá-lo ele, todo macho, recusa sua companhia dizendo que não precisa disso.

Lá dentro, quando lhe colocam o garrote, pede aflito que chamem outro funcionário, para que lhe segure o braço, pois: “ele se conhece muito bem e sabe do que é capaz!” Feito isso, pálido e trêmulo deixa colher o sangue, sem olhar para a agulha.

Ao terminar, o atendente oferece-lhe o habitual café para quebrar o jejum. O alemão recusa todo macho, dizendo que não precisa disso!

Ao sair, a namorada vem a seu encontro e muito meiga pergunta: “oi, amor, como foi?”, ao que o outro todo macho responde: “bobagem, não foi nada!”

E o narrador, continua: “na frente da namorada o alemão era todo macho, lá dentro parecia menina pedindo para segurar o braço. Ah, eu queria ir ao casamento deles e naquela hora do “se alguém sabe de alguma coisa...”, ia me levantar e gritar pra noiva: “cuidado aí meu, teu guaraná é fanta!”.

Gargalhadas e mímicas ilustravam a narrativa que divertia a platéia e amenizava a viagem.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Da janela do APÊ

A ação foi rápida. Pouco mais de quinze minutos.

Por volta das vinte horas, o bar da esquina estava repleto de fregueses. Homens que trabalham nas redondezas, outros moradores do bairro, enfim, o mesmo grupo que todos os dias a essa hora se reúne para um lanche, beber um pouco e jogar conversa fora.

Nesse dia em especial tinham muito a conversar. A seleção brasileira de futebol, após um jogo difícil, vencera o time da Suécia e conseguira se classificar para as oitavas de final daquela copa de 1994.

De repente, dois homens estranhos entram no estabelecimento, apontam armas para o caixa e exigem que lhes entregue a féria do dia. Tudo rápido, sem que ninguém perceba.

Os fregueses só se dão conta do que está acontecendo, quando após dois estampidos surdos, um corpo tomba ao chão e o sangue começa a se espalhar por baixo das mesas misturando-se com a cerveja derramada.

Correria, gritos, pânico.

Um homem corre desabaladamente pela rua, arma em punho e antes que chegue à esquina é interceptado por uma viatura policial que saiu não se sabe de onde. Tenta reagir, é atingido e tomba já sem vida.

A esquina parece uma praça de guerra. Várias viaturas com refletores girando luzes vermelhas e azuis projetam reflexos nos edifícios em volta, dando um ar de comemoração da recente vitória da nossa seleção.

Uma pequena multidão curiosa tenta se aproximar mais do que é permitido.

Policiais agitados fazem as anotações de praxe à medida que conversam com as testemunhas presentes. Sem mais delongas os corpos são removidos e colocados em viaturas especiais que disparam pela noite adentro com as sirenes ligadas.

Em poucos minutos todos se afastam. As portas do bar se fecham e só o que se vê é a espuma de sabão retinta de sangue escorrer por debaixo, manchando a calçada em frente.

Dois assaltantes foram mortos. Um pelo dono do estabelecimento, outro, pela polícia.

E a vida continua como na programação de TV, basta apertar um botão e estamos sintonizados em outra realidade.

Aos poucos vou reunindo as fotos antigas


Meus avós paternos, Luiz e Deolinda, em Piracicaba, SP, logo após as núpcias, em 1917, em foto que esteve submersa nas águas lamacentas que invadiram nossas casas por ocasião das enchentes do Córrego do Cordeiro, Vila Carmen, Brooklin.