segunda-feira, 28 de novembro de 2011

UMA SIMPLES IMAGEM

Casei em 1965 e no mesmo ano conheci dona Alzira, uma senhora portuguesa viúva, amiga de dona Rita Petroni e que com esta, levava a imagem do Menino Jesus nas casas nos dias da novena de Natal.

De volta ao bairro, em 2004, conheci outra portuguesa, amiga de minha mãe, dona Maria Portuguesa, como é conhecida. Ela chegou na década de 70 e, muito religiosa, ingressou no grupo de dona Rita e dona Alzira.

Pois bem, em dezembro de 2007, estava eu com um projeto de presépio, faltando o Menino Jesus, quando um belo dia, me aparece dona Maria Portuguesa, com uma embalagem de biscoitos amanteigados para minha mãe e uma sacolinha na mão. Meio sem jeito, tira de dentro uma cestinha com uma imagem e me pergunta se eu aceitaria receber o Menino Jesus, que fora da dona Alzira, para passar o Natal daquele ano, em minha casa.

Essa imagem, que deve ter mais de 50 anos, pertencia à paróquia, ficou aos cuidados de dona Alzira definitivamente e, quando ela adoeceu, passou-a para dona Maria Portuguesa que hoje é sua guardiã.

Sem o saber, ela acabava de completar o meu presépio e muito mais que isso, me fazia retroceder quatro décadas, me ver na ampla sala da casa de dona Alzira, rodeada de senhoras conhecidas, numa época muito feliz da minha vida.

Abracei-a emocionada e embora ela não entendesse muito bem, agradeci o valioso presente de Natal que me deu.

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

A imensa alegria de servir

Gabriela Mistral,
Poetisa chilena (1889-1957)

Toda natureza é um desejo de serviço.
Serve a nuvem, serve o vento, serve o sulco.
Onde houver uma arvore para plantar, planta-a tu;
onde houver um erro para corrigir, corrige-o tu;
onde houver uma tarefa que todos recusem, aceita-a tu.
Sê quem tira a pedra do caminho, o ódio dos corações
e as dificuldades dos problemas.

Há a alegria de ser sincero e de ser justo;
há, porém, mais que isso, a imensa alegria de servir.
Como seria triste o mundo se tudo já estivesse feito,
se não houvesse uma roseira para plantar,
uma iniciativa para lutar!

Não te seduzam as obras fáceis.
É belo fazer tudo que os outros se recusam a executar.
Não cometas, porém, o erro de pensar
que só tem merecimento as grandes obras;
há pequenos préstimos que são bons serviços:
Enfeitar uma mesa.
Arrumar uns livros.
Pentear uma criança.
Aquele é quem critica, este é quem destrói, sê tu quem serve.
O servir não é próprio dos seres inferiores:
Deus, que nos dá fruto e luz, serve.
Poderia chamar-se: o Servidor.
E tem seus olhos fixos em nossas mãos e nos pergunta todos os dias:
– Serviste hoje?


COMENTANDO
Tão difundido esse poema da Gabriela! E tão belo e verdadeiro também! Fácil de ser compreendido, gostoso de ser declamado – mas difícil de ser vivenciado. Será por quê?...

Pode ser que tenhamos realmente o gosto pelos atos grandiosos e pelos aplausos.

Talvez queiramos evitar compromissos que exigem muito de nós.

Acredito que muitos simplesmente não creem que a felicidade possa ser encontrada
nas tarefas simples, humildes e cotidianas que a poetisa nos aponta.

Certamente existem também aqueles que em seu comodismo ou insen-sibilidade nunca sequer pensaram em experimentar a felicidade de servir.

Existe, todavia, o seleto grupo daqueles que servem alegre e espontaneamente, sem a menor preocupação em saber se são felizes ou não. São bem-aventurados!

Por fim fica a pergunta: em qual desses grupos cada um de nós se situa?

Pe. Luiz Carlos
lcnascimento50@gmail.com

terça-feira, 15 de novembro de 2011

Casa D. Macário - Um sonho que deu certo

Assistindo aos noticiários sobre a violência crescente em nossa cidade, sempre me reporto a uma instituição onde trabalhei: Fundação Lar de São Bento – Casa D. Macário – Vila Maria - SP

Foi ali que lecionei de 1985 a 1988.
1º de abril de 1985 – Dia do meu registro na Carteira Profissional.

Uma instituição beneficente, mantida por ex-alunos do Colégio São Bento, que abrigava em regime de semi-internato, meninos do grupo “de risco”, que necessitavam de assistência e acompanhamento. Vinham da favela do Parque Novo Mundo, mais precisamente da “Funerária”, a ala mais miserável da favela.

Na casa, os meninos recebiam alimentação, instrução, assistência médica, odontológica, psico-social e formação profissionalizante, freqüentando o lar no período das 7 às 19 h de segunda a sexta-feira.

O diretor, desde a fundação era Dom Afonso Niessl O.S.B. – monge beneditino, alemão, cego, que com pulso forte e muito amor conduzia a instituição, selecionava pessoalmente os funcionários e conhecia a história de vida de cada menino. Era a alma daquela comunidade.

Além das dependências administrativas e das salas de aula, a Casa dispunha de quadras de esporte, vestiários, refeitório, cozinha industrial equipada e uma oficina com 50 tornos e diversos materiais para o desempenho das atividades profissionalizantes – tornearia mecânica e eletricidade. Os meninos saíam da Casa, após a 8ª série do 1º grau, aptos para prosseguir os estudos e exercer como “meio oficial” suas profissões.

De modo geral rebeldes e inconformados com os desmandos a que eram submetidos em seus lares, encontravam ali um ponto de referência para uma vida nova e diferente. Atenção, carinho, disciplina, orientação e cuidados faziam com que gostassem dali e colaborassem para o bom funcionamento da Casa. Participavam da organização, limpeza e atuavam como ajudantes de cozinha e no refeitório.

A condição para o menino ter direito a permanecer ali era estudar, interessar-se pelas aulas práticas, manter a média escolar, ser assíduo. Ao ingressar um familiar adulto assinava um termo de responsabilidade, garantindo que no período que estivesse fora da Casa, o menor seria assistido. As famílias também recebiam assistência e orientação.

Hoje, fiquei feliz, pois ao buscar uma foto para ilustrar este relato fiquei sabendo que o sonho de Dom Macário, perpetuado por Dom Afonso continua espalhando o bem naquela região.

Confira: www.casadommacario.org.br

domingo, 13 de novembro de 2011

UM GESTO SOLITÁRIO

5 de junho de 1988. Tarde gelada e molhada – o segundo dos dias mais tristes de minha vida. Velório do Hospital Alemão Osvaldo Cruz, Paraíso. Meu filho José Cláudio, 18 anos, velado, em caixão lacrado coberto de flores brancas, após acidente de moto.

Querido, reunia ali para o último adeus, uma legião de parentes, amigos de escola, igreja, trabalho, de São Paulo e outros tantos vindos de Mogi das Cruzes. Jovens que eu conhecia e outros desconhecidos, que se solidarizavam com nossa dor.

Logo após a cerimônia religiosa, uma mulher cabisbaixa caminha lentamente em meio às pessoas em direção à urna fúnebre, faz uma prece silenciosa e num gesto ritual, deposita ali um botão de rosa vermelha. Depois vem em minha direção, pede desculpas por estar ali, apresenta-me os pêsames e diz que tinha de vir, pois sempre foi tratada com muito respeito pelo meu filho, que conversavam muito no trabalho dele, que ele era bom e não discriminava as pessoas. Abraçou-me e sumiu.

Sem entender, indaguei aos mais próximos sobre quem era ela. Constrangido, um rapaz, colega de trabalho do meu filho, explica que era uma prostituta da Rua Rego Freitas, cliente, como tantas outras, do estacionamento onde trabalhavam.

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Coincidência?!

Nota: Sondava minhas pastas em busca de alguma coisa para colocar aqui, já que não ando muito inspirada, quando me deparei com o título "Amendoim". Lembrava do fato, mas não da totalidade do texto. Abri, li, decidi utilizá-lo e para fazer constar, cliquei com a direita do mouse no arquivo fechado e lá estava: data da modificação: 8/11/2004 - 18:47. Arrepiei e olhei para o relógio: 18:48. Matematicamente exatos 7 anos!

AMENDOIM

Ontem não resisti. Final de tarde, volta do trabalho, Rebouças congestionada. Aqueles ambulantes vendendo amendoins nos cones de papel amarelo, quentinhos!

Eles estão por toda parte. Lata nas mãos, com uma abertura de um dos lados e um tipo de cesto cheio de brasas dentro. Em cima, os canudinhos arrumados lembrando um Coliseu.

De vez em quando tiram o cestinho de brasas, seguram por uma alça e num movimento de pêndulo incensam a noite que se aproxima, reavivando o fogo e dando um colorido especial às esquinas, praças e canteiros centrais.

Na altura da Joaquim Antunes o trânsito embolou de vez. Nada anda. No console a moeda olhando para mim. Eu olhando para o amendoim (Chi... rimou!). Abro o vidro e cedo à tentação.

Saboreando aqueles grãos sem pele, recobertos de sal, lembro-me da barraquinha de doces do seu Luiz, na porta do Grupo Escolar Mário de Andrade. Ele vendia esses cones com amendoins, tinham pele, o cone era maior e feito de papel de pão.O gosto era o mesmo.

Na Oscar Freire, entorno o sal acumulado no fundo do saquinho, ao som de “Time as to time” do Rod Stewart, enquanto pessoas encolhidas e carrancudas saem das lojas de grife carregando sacolas coloridas. Faz frio.

Observo-as e penso: olha eu aqui, deslizando a 10 por hora ao sabor do amendoim torradinho, com gosto de matinée de domingo, tarde no circo, pelada no campinho, tudo pela módica importância de R$ 1,00!