sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Sobre bondes e futebol

Com toda essa euforia por causa do Pan e das últimas decisões sobre a Copa de 2014, me reportei às copas passadas, suas alegrias e tristezas e em especial, a um incidente, ocorrido quando da primeira que acompanhei, em 1958, quando um bonde estragou a alegria de nossa família, por ocasião da vitória de nossa seleção contra a Suécia no jogo final daquela Copa do Mundo.

Ouvíamos o jogo pelas ondas oscilantes da Rádio Bandeirantes, na voz inconfundível de Edson Leite, sentados à soleira da porta da cozinha enquanto as mães preparavam o almoço daquele inesquecível domingo. O Brasil ganhava e a tensão contagiava a todos com a iminência da conquista da tão sonhada “Jules Rimet”.

Nos minutos finais, um barulho de ferros e pedras sendo arrastados espalhou-se pelo ar misturando-se com o farfalhar da folhagem das árvores, agitadas pelo vento fortíssimo daquela manhã e abafando por alguns segundos a voz do radialista. Seguiu-se um baque surdo e todos dirigimos nossa atenção para os lados da linha do bonde, onde podíamos observar uma nuvem de poeira que se elevava do chão. Algo grave havia acontecido.


Bonde da linha Praça João Mendes - Santo Amaro

O rádio foi deixado de lado, falando sozinho. Os homens correram e nós, crianças, ficamos junto à cerca de arame farpado, curiosas e desapontadas por não poder acompanhá-los e ver o ocorrido.


A cerca de arame farpado

Um rapaz, que pescava no Córrego do Cordeiro, debaixo da ponte da linha do bonde, saiu inadvertidamente do mato e atravessou os trilhos sem perceber o bonde que se aproximava. Sem o que fazer, o motorneiro atento tocou o sino e baixou o limpa-trilhos, evitando com isso uma tragédia maior, não conseguindo, no entanto evitar o choque do veículo com a cabeça do garoto, que mesmo bastante machucado sobreviveu e recuperou-se com a colocação de uma prótese craniana, conforme soubemos tempo depois.

O que não pode ser substituído, porém, foi o final da transmissão do jogo com a consagração do Brasil como Campeão Mundial de Futebol pela primeira vez. Tudo por “culpa” de um bonde! Mas em compensação, devo confessar que foi um bonde que me levou à Praça da Bandeira, num sábado nublado e frio de julho de 1958, onde pude com milhares de outros paulistanos, receber com orgulho a nossa gloriosa seleção.


Úlimo bonde em 1968

Em meio a um espetáculo pirotécnico grandioso, com canhões que lançavam aos céus bólidos que explodiam e liberavam enormes bandeiras que coalhavam o seu daquele
entardecer garoento, com seu verde e amarelo, tive o privilégio de ver Pelé, revelação daquela copa, ao lado de seus companheiros de time sobre o carro dos bombeiros e me emocionei, com o capitão Bellini erguendo orgulhoso, a reluzente taça Jules Rimet.

Capa da revista “JÁ”, suplemento do Diário Popular, edição de domingo, 17 de maio de 1998, que coincidentemente tem como destaques os bondes e as Copas do Mundo.

Um comentário:

  1. Fui durante anos vizinha d radialista Edson Leite: uma figura!
    Nossa o rapaz sobreviveu ao acidente
    Quanto aos jogos: bons tempos, boas vitórias,bons jogadores que mais jogavam por amor e muita raça!

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