Embora paulistana de nascimento, conheço bem pouco da cidade e menos ainda dos trajetos dos ônibus além das fronteiras do bairro onde cresci e seus arredores, assim, consultar o Google maps em nada ajudou, pelo contrário, confundiu-me ainda mais. Três conduções? Trajetos a pé? Inviável, até que encontrei a Li e a Mo, amigas da paróquia.
“Rua Roma? Lapa? Simples
demais. Pega o 856-R e desce no ponto final. Tá lá!” Diz a Li.
“Só isso? Mas o Google...”.
“Esquece”, interfere a Mo.
“Pega aquele laranjinha, Lapa / Socorro, ali, no primeiro ponto e relaxa”.
“Mas leva um livro”,
recomenda a Li dando risada. ”Demora...”.
“Quanto tempo antes da
consulta devo sair?”.
Mo: “três horas!”.
A apreensão volta. “Tudo
isso? Será que duas não são suficientes?”
“Pelo menos duas e meia” –
adverte Li.
“Fica perto de um shopping”
– informa a Mo toda animada. “Se chegar cedo pode dar umas voltas por lá.”
Ah se ela soubesse como me
sinto acerca de shoppings...
Terça feira. Levanto e já começo os preparativos para a “viagem”
à Lapa. Identidade, cartão do SUS, encaminhamento da UBS, máscara, agasalho,
guarda chuva – nunca se sabe... Ah! O livro!
O ônibus não demora.
Lotado! Quero ler, mas leitura e malabarismo não combinam. Vaga um lugar e
mergulho no policial de corpo e alma.
Lá pela página quarenta e
pouco olho pela janela e viajo na viagem pelos caminhos desconhecidos.
A cobradora falava o tempo
todo, muito alto. Sentada no banco imediatamente atrás do motorista tinha, além
dos solavancos que sacudiam até o cérebro, uma vista privilegiada, mas o toc...
toc... contínuo que vinha de algum equipamento do coletivo soava como o som de um
relógio gigante e torturante. Toc... Toc...
A cobradora grita: “a
porta está caindo!”. “Esta porcaria está desmanchando” – rebate o motorista. “Até
o ponto final vou ter só o volante nas mãos”. Risadas.
“Motorista, o senhor corre
muito e faz manobras perigosas. No veículo tem muitos velhinhos” – reclama a
senhora não tão velhinha, antes de descer. Suspense. Se fosse a outra linha, a
que costumo utilizar no dia a dia, a m... estava feita. Ia dar briga.
O motorista fechou a porta,
suspirou: “velhinhos...” e seguiu. Ufa!
Como previsto cheguei
quase duas horas antes do horário da consulta. Acho que, pela tensão das
novidades, estava com fome. Muita fome. Tinha visto o shopping, mas só de
pensar em circular por lá, as mãos suavam.
Então fiz o que nunca imaginaria fazer: entrei num tipo de lanchonete/botequim.
“Tem algo sem carne?” – pergunto meio constrangida. “Não senhora.” Agradeço e
vou saindo. “Mas posso fazer um queijo quente se quiser”. “Quero!” E como quero,,,,
”Com café puro, por favor,”.
Em meio a cardápios, pôsteres
de bebidas e sanduíches, a frase: “O sabor da vida depende de quem a tempera”.
Taí, gostei. Filosofia de botequim.
Já na AMA do Idoso Oeste,
depois de cumpridas as formalidades e xixi feito, retomo a leitura. As duas
vítimas de assassinato que aparentemente nada tinham em comum, na verdade eram
amantes e a trama toma um rumo instigante, Enquanto isso a Eileen com o grupo
de negociação com sequestradores, interagia com um velhote asqueroso que
mantinha a neta sob a mira de uma espingarda de dois canos e pedia uma
prostituta em troca da soltura da pobre Pamela...
“Lidia Aparecida Walder!” –
grita a otorrinolaringologista a plenos pulmões. Sob a tensão que me encontrava
assusto, mas reconheço que aquele grito até tinha lógica em vista da
especialidade dela. Entro no consultório meio aturdida. A consulta não dura mais que cinco minutos e
sou avisada de que num futuro não muito próximo serei comunicada da data do
exame que deverei fazer.
A viagem de volta foi
rápida. Porque será que o caminho de volta é sempre mais curto que o de ida?
Depois de seis horas fora
de casa, exatamente na página 143 chego ao meu destino. A pobre Pamela foi salva finalmente, mas os
outros casos do 87º DP ainda continuam pendentes. Vou ter que ir à Lapa de novo
para terminar esse livro. Obrigada pela dica Mo e Li.
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