quinta-feira, 29 de março de 2012

Em Moema “A Vida Era Bela”

1939 – começa a 2ª guerra. Walter, operário, 19 anos e Maria, empregada doméstica, 16 anos, ambos moradores de Moema, que então chamava-se Indianópolis, não se conheciam e enquanto alguns jovens do bairro lutavam numa guerra que não era deles, suas vidas continuavam, apesar do fantasma de uma possível convocação.

 Em Moema havia um clube: o União de Indianópolis – uma sociedade com salão de baile e campo de futebol, este, na Alameda dos Maracatins. Foram seus presidentes nessa época, o Bigode e o Sr. Pinhão, dos quais infelizmente só lembramos os apelidos. Também havia o Antonio Saraiva, o Palha, que era diretor esportivo do clube.

Walter, o Meningite, apelido dado pelos colegas que se reuniam no Largo Franco, era goleiro do time de futebol e foi locutor do programa de calouros do clube, A Peneira, até que o substituíram por Jorge Frassati, melhor qualificado para ler os comerciais dos patrocinadores.

 O Mario Cozel, chefe da mecânica na Fiação Campo Belo, também jogava no time e tinha uma cunhada que no final do ano emprestava um piano para a final de gala do concurso de calouros, ocasião em que as lojas patrocinadoras ofereciam os prêmios aos melhores. (Esse Mario Cozel, era o pai do Mario Cozel Filho, aquele jovem que foi morto na explosão de um carro bomba, na porta do 2º exército, durante a vigência do AI-5. Ele servia o exército e estava de sentinela naquela hora. O jipe foi abandonado ali e ele foi verificar de que se tratava. Era um atentado terrorista e ele morreu. Aquela praça em frente ao QG do 2º Exército tem o seu nome e um busto em sua homenagem).

 Voltando ao União de Indianópolis, aos domingos o Narciso Vernise – o Homem do Tempo que todos conhecemos - irradiava pelo alto falante, as corridas de cavalo do Jóquei Clube, para os freqüentadores do campo de futebol. Um dia, durante um campeonato de várzea coberto pela Rádio Panamericana, ele foi notado e convidado pela equipe para apresentar,  naquela emissora, o programa sobre metereologia.

 O Ernesto Cinquetti, também fazia parte dessa turma e quando os pracinhas de Moema voltaram da guerra, ele mandou celebrar uma missa em ação de graças com a presença deles no campo de futebol da Fiação Indiana. Foi uma comoção geral!

Maria, freqüentava um cinema do bairro, acompanhada sempre pela mãe e pela melhor amiga – Nair. Não perdia um filme do Nelson Ed com a Janette Mac Donald – dramas cheios de sofrimento e música lírica. Muito bonita, Maria era comparada a atriz Mary Pickford.

 Durante as sessões de cinema, nas cenas mais tristes, ouviam-se estrondosas gargalhadas na platéia. Era um grupo de rapazes, o Jorge, o Ricardo e o Nêgo, que incógnitos, divertiam-se em ridicularizar o comportamento das choronas de plantão e à saída, ficavam nas portas, zombeteiros, encarando as moças de olhos vermelhos e lacrimejantes.

 Walter e Maria se conheceram nos bailes do União, namoraram e casaram-se em 1943. Enfrentaram juntos racionamentos, blckouts, desemprego e em 1945, no final da guerra, pouco antes de Hiroshima e Nagasáki, tiveram uma filha: eu.

quinta-feira, 22 de março de 2012

08/08/2008 – O dia da felicidade!

Procurando uma foto, achei isto aqui. Deixo registrado.


08/08/2008 – Segundo os oráculos, nesta data cabalística tudo de bom deve acontecer.


Acordo às 4h com o toque do telefone. Susto. Medo. Dor de cabeça. Um engraçadinho me chamando de "meu bem". Ainda se fosse verdade...




Abertura das Olimpíadas – que coisa linda! Meu pai não para de reclamar e criticar. Para ele nada é bom. Largo-o sozinho e assisto com a mãe, para quem tudo é maravilhoso.


11h - Ligo para o banco. A voz gélida da máquina me informa que o meu salário não está lá! Susto. Medo. Dor de cabeça. Zumbido no ouvido. Como vou pagar as contas?!


Dirijo-me ao estabelecimento bancário. Sou aposentada e esqueci de fazer o recadastramento no mês do aniversário e, para o Estado, morri em junho. Já sou mais ossada que de costume. Como o funcionário público faz jus ao auxílio funerário, ainda recebi o salário em julho, por isso não percebi antes.


Para ressuscitar, bastou apresentar-me pessoalmente ao gerente, com o holerite e a identidade em punho. Tudo resolvido. O salário estará disponível em 10 DIAS ÚTEIS! As contas que esperem até lá!


Começo da tarde, voltando do banco. Cruzamento da Joaquim Nabuco com Vereador José Diniz. Sinal vermelho. Chove muito. Estou na faixa da direita, rente à calçada. O motoqueiro vem e choca-se com o para choque traseiro. Nem liga. Digo:


 - Olá mocinho, você viu que bateu no meu carro?


 - Eu não bati, foi meu braço que esbarrou aí!


 - Que braço duro heim?! Foi a moto!!!


 - Olha aqui dona, eu bato o meu braço nesse lixo e você reclama!! Acha que vou bater minha moto? Ela custa $40.000, não é como esse lixo! Tá pensando que sou moto boy? NÃO!!! Sou polícia!


 - Ká! Ká! Ká! Tô morrendo de medo!!!!


 O mocinho arrogante sai com o farol fechado e se lança no mundo em ziguezagues estonteantes. E chove! 


Sabe o que mais doeu nesse dia da felicidade? Ouvir chamar o KA-rrinho de LIXO!!!!


Só lembrando: Os organizadores das Olimpíadas de Pequim enganaram bilhões de pessoas com a apresentação daquela menina graciosa vestida de vermelho na abertura dos jogos, a Lin Miaoke dublando a voz de Yang Peiyi, que não apareceu por ser considerada feia. 

quarta-feira, 21 de março de 2012

Encontros e mais encontros...

Com Damáris na Casa das Rosas em abril de 2007

Participo do www.vivasp.com, um site de memórias paulistanas, desde a sua criação em 2003 e desde então tenho vivenciado momentos de emoção e alegria,  compartilhando memórias de vida e da cidade, recebendo demonstrações de carinho, conquistando amizades. Por causa dessa participação fui encontrada e pude reatar contato com pessoas que há muito não via. Conto um desses reencontros.

No dia 23 de março de 2007 recebi a seguinte mensagem de email:

 “Oi Lídia, Tive uma surpresa agradável em descobrir seu e-mail em um comentário sobre o Senhor Roque Petroni, antigo farmacêutico do Brooklin. Eu conheci você na Legião de Maria. Não sei se você lembra. Por favor, ligue para tirarmos as dúvidas. Telefone. Damaris. Um abraço.”

Meu coração disparou. Era a Damaris, minha amiga e companheira da Legião da Maria, na Paróquia S.C. de Jesus, na década de 60.

Liguei imediatamente, conversamos, choramos e daí em diante mantivemos contato por email e telefone, até que combinamos de nos encontrar na Casa das Rosas, no encontro de abril, do vivasp.com. Conversamos bastante, colocamos mais de quarenta anos de nossas vidas em dia. Pura emoção!

Roque e Rita Petroni foram seus padrinhos, sobre os quais escrevi, assim, repassei seu e-mail para Gabriel Petroni (que foi meu aluno), filho deles, que por sua vez buscava informações para escrever sobre a mãe. Recebi então esta mensagem do Gabriel:

 “Já entrei em contato com a Damaris, já conversamos, me contou muitas coisas que eu não sabia, ficamos de nos encontrar. Valeu !!! A tempo, preciso de depoimentos seus para adicionar a meus escritos.Acho que seriam valiosos. Bilé”.

O encontro entre os dois aconteceu e coincidentemente no mesmo dia, passando em frente à casa onde dona Rita morava, vi os irmãos Fábio, Cláudio e Gabriel no portão. Cumprimentei-os e Gabriel, emocionado, me falou do encontro.

Dias depois, Damaris me contou que pode, com emoção, lembrar-se durante a conversa, os bons momentos vividos junto à madrinha e o quanto de bem ela fez pela afilhada (como para tantos outros).

Damaris ficou fã do vivasp.com e apareceu no encontro seguinte, e, ao término, convidei-a para participar do “Orar cantando”, que aconteceria a partir das 20h, na igreja.

Ao chegarmos encontramos minha amiga, irmã Viviana e apresentei-as. Conversa vai, conversa vem, falando de nossas andanças pela vida, irmã Viviana disse que as freiras, também mudam muito, segundo as necessidades de suas ordens, assim, ela que é de Guarapuava no Paraná, já morou em Osvaldo Cruz interior de SP, etc...

 Ao ouvir o nome Osvaldo Cruz, Damaris diz que tem lá alguns parentes – tio, primos... E um pouco mais de conversa vai, conversa vem, as duas descobriram que irmã Viviana era a enfermeira no abrigo de idosos, naquela cidade, onde seu João, 100 anos, tio de Damaris, solteiro e sem filhos, mora. E mais, irmã Viviana era quem cuidava dele enquanto lá estava, foi quem o encaminhou para a cirurgia de catarata e quem o acompanhou em todo o processo de recuperação.

Lágrimas brotavam nos olhos daquelas duas mulheres, tão diferentes, estranhas até então e agora unidas por um afeto comum e encantadas com as coincidências. E eu ali, de boca aberta, feliz e emocionada, por ser, de certa forma, responsável por aquele encontro e aquelas  recordações.

Não houve o “Orar cantando”, o padre estava gripado, assim decidi dar uma carona para Damaris até a sua casa, no bairro de Cidade Dutra. Agora o melhor: Ela morava na mesma rua onde morei quando me casei. 

Deixei-a em casa, dirigi por alguns metros e lá fiquei parada diante daquela casa, construída com tantas esperanças, onde tive e perdi minha escola e onde minha filha nasceu. Aí foi demais, desatei a chorar no meio da escuridão, com vista ainda, para o Autódromo de Interlagos.

Em maio de 2009 Damáris faleceu depois de uma longa e dolorosa luta contra o câncer.

sexta-feira, 16 de março de 2012

QUERO MORRER LÁ PERTO DE CASA!

Segunda feira, dia 12 de março, levei meu pai ao pronto socorro por conta de dor aguda na face, degeneração dos nervos trigêmeos. PS de um hospital, que não é de primeira linha, mas é tradicional e atende pelo nosso plano de saúde.

Na triagem, depois de explicar tudo ao enfermeiro, ele me olha estranhamente, titubeia e escreve alguma coisa. Entrega o termômetro na mão do meu pai, que treme e com a outra segura a bengala sem saber o que fazer. Mais um pouco e pergunta:

 - A senhora disse que ele tem tri... O quê?!

Encaminhado para o clínico, é acomodado numa maca no pronto atendimento e bem depois a atendente de enfermagem aparece para fazer a punção na veia para colocar um acesso. Espeta a agulha instala o acesso e nada sai nem entra. Ela revira a bandeja cheia de embalagens, luvas, etc, de outro atendimento, em busca de alguma coisa. Olha na maca, olha no chão. Nada. Tenta de novo injetar água destilada nada!

 Comento:

 - Será que perdeu o acesso?

 -É, vou chamar o rapaz.

O rapaz, que devia ser um enfermeiro “mais graduado”, tira o acesso e olha a agulha. A adorável mocinha não havia tirado a parte interna, que fecha a passagem até a colocação do acesso  (Devia ser isso que procurava). Olham um para o outro e disfarçam...

Pergunto ao “rapaz”:

- E as luvas?

Bem, foi tanta justificativa sem propósito, que nem vale a pena comentar.

Nesse momento, lembrei-me do que meu pai sempre diz, quando se fala em internação hospitalar:

 - Quero morrer lá perto de casa!

 Essa experiência levou-me a resgatar um texto que escrevi em setembro de 2005, para o www.vivasp.com, que posto abaixo.

 “Um zero – A diferença entre a vida e a morte


Hoje enquanto fazia o jantar, escutava o Ney Gonçalves Dias berrar naquele seu programa sensacionalista muito apreciado por meu pai, a notícia do caso da menininha que faleceu no Hospital do Mandaqui, após receber soro glicosado a 50% quando deveria ser 5%. Um pequeno engano, apenas um zero a mais que determinou o fim de uma vida. 


Imediatamente lembrei-me de certa vez em 1995, quando de ônibus subia a Avenida Brigadeiro Luiz Antonio e algumas atendentes de enfermagem do Hospital Brigadeiro entraram e duas sentaram-se no banco atrás do meu. 


Chamou-me a atenção quando uma delas perguntou se a outra havia conseguido entender aquelas continhas de regra de três, ensinadas no curso. A outra respondeu que eles tinham ensinado esse negócio, mas que ela não tinha entendido nada. A primeira perguntou então como é que ela calculava a medicação de acordo com a variação do peso do paciente. A segunda simplesmente respondeu que “calculava mais ou menos”. A primeira riu e disse que não podia ser mais ou menos, que ela devia aprender a fazer a regra de três, que dava certinho."

Todas essas ocorrências são resultantes de anos de descaso com a Educação e decadência do ensino público que presenciei acentuar-se expressivamente nos meus últimos anos de carreira e à falta de qualificação profissional. Mais ou menos já está bom demais.

Prioriza-se a quantidade em detrimento da qualidade. A educação é reduzida a números para satisfazer
às estatísticas de erradicação do analfabetismo a ser apresentada aos financiadores estrangeiros.

Convivi, no pouco tempo que trabalhei no setor privado, com diversos funcionários que, com o ensino médio completo, não eram capazes de escrever corretamente uma lista de alimentos e produtos de cozinha.

O pior é quando esses oriundos do ensino público vão parar em setores em que o saber ler, interpretar e calcular faz a diferença entre a vida e a morte.


terça-feira, 13 de março de 2012

É o extermínio!

12 de março, dia de Santo Inocêncio.

Santa inocência, isso sim, a minha, quando achei que a segunda feira ia ser um dia de muito trabalho. Muito? Não, ainda precisa ser inventada a palavra para descrever o que foi a minha segunda feira. Minimizando diria que vivi as 24h da fúria.

Saio logo cedo para comprar uma peça no Morumbi enquanto fazia hora por causa do rodízio. Antes, abasteço o carro e vou à farmácia. A maquininha do Mastercard avisa: “cartão inválido”. Inválido como, se acabei de pagar o combustível? Pago em dinheiro, o dinheiro que era para comprar a peça, e, com a pulga atrás da orelha, começo, ali mesmo na farmácia, a via sacra para falar com o banco.

Muitos minutos depois e diversas tentativas erradas de acesso, sou informada que não havia nada com o cartão. Espumando, antes do final rodízio, volto ao caixa que já me esperava com um sorriso para dizer que era problema com o sistema da Mastercard.

Conclusão: não comprei a peça, fui até uma agência do banco para sacar e como São Tomé, conferir o cartão. Pronto. Já havia passado a hora do rodízio e sigo para o ap. para uma faxina geral. Preciso dele limpo e desocupado de tranqueiras.

Não vou descrever a faxina, seria literalmente cansativo, pois há uns seis meses não ia lá. Só digo que entre os guardados estava a roupa com que meu filho morreu executado, a parte que a polícia devolveu, o que interessava não veio. Há 12 anos e meio preciso me desfazer daquilo. Ontem foi o dia. Chorei tudo o que tinha direito e dá-lhe limpeza.

Não almocei, trabalhei duro e quando entrei no carro depois do banho tomado, pensei: "Que bom, fiz o que precisava, agora é só chegar a casa, cuidar do pai, comer muito, dar uma passada no facebook e DESCANSAR assistindo a um bom DVD.


Santa inocência! Era de novo hora do rodízio e esqueci completamente. Acho que fui flagrada por umas seis câmeras. Seja o que Deus quiser, estava na rua, precisava vir para cuidar do meu pai que estava só.

Ao chegar próximo de casa, parecia que havia passado um furacão. As ruas pareciam praças de tanta planta amontoada. Era preciso desviar. Em casa, 300m² de área forrada de verde e o telhado do terraço onde trabalho destruído. Abri a porta da cozinha, com medo do que fosse encontrar. Graças a Deus, nada além do susto.


 

Já era mais de 22h quando finalmente consegui separar o joio do trigo, nos meus materiais, separando, jogando, lavando.

 

Balanço de hoje: mais de 1000 litros de lixo recolhido, a maior parte pela “santa” Maria, minha doméstica querida, minhas mãos feridas pelos cacos das telhas e eu, bem DESCANSADA, passei o dia, sem almoço de novo, com meu pai no Pronto Socorro. 


É o extermínio!