Sou otimista, espero um futuro melhor, acredito que a vida é boa e “a felicidade até existe”, não curto desgraças, prefiro falar das rosas e ignorar os espinhos, mas a realidade está aí e de vez em quando a gente deixa de ser espectador e passa a protagonista. Foi o que aconteceu comigo no verão de 2002.
Avenida Brasil próximo a Rebouças, 18 horas e muitos minutos. Trânsito quase parado, calor insuportável.
De carona com minha amiga Silvia, voltava para casa após um exaustivo dia de trabalho quando, paradas num semáforo, vidros burramente semiabertos, aparece não sei de onde, um garoto, encosta algo em meu rosto próximo à orelha e pede dinheiro.
Silvia apavorada pede calma e vira-se para pegar a bolsa. Escorrego a minha para debaixo do banco, a féria do dia do restaurante estava nela. Não sei por que, burramente, virei-me devagar e olhei de soslaio o que ele encostava no meu rosto. Era uma garrafinha de refrigerante com o fundo quebrado.
Num reflexo, segurei-lhe o pulso. Ele tentou trocar o objeto de mão e eu segurei o outro pulso, gritando para Silvia fechar o vidro dela e tentar fechar a janela do meu lado.
Com as mãos para fora, segurando o menino com toda força que Deus me deu naquela hora, olhava desesperada para o semáforo que não abria.
A Silvia não conseguia fechar o meu vidro, pois os meus braços estavam sobre ele, agüentando o peso do menino que com o pé apoiado na porta do carro esforçava-se para atingir meu rosto com a garrafa e tentava morder-me as mãos.
Olhava para o rosto esquálido daquele menino de uns doze ou treze anos, desfigurado pela raiva e pela miséria e sentia um misto de pavor e pena. Pavor pela possibilidade dele atingir meus olhos e pena por ver o que um sistema injusto, que deixa as drogas correrem solto, consegue fazer com uma criança.
O semáforo abriu, a Silvia arrancou e eu larguei o garoto que rolou no chão e sumiu. Pouco adiante o trânsito pára novamente. Que pavor! Foi então que apareceu um jovem, para nos perguntar se precisávamos de ajuda, pois ele presenciara tudo.
Todos os que estavam à nossa volta presenciaram tudo, mas ninguém se arriscou a sair da segurança de seu veículo, mesmo vendo que o garoto só empunhava uma garrafa e eu o segurava.
O incidente me custou alguns hematomas nos braços, torcicolo e mau jeito no tornozelo e à Silvia, a certeza de por um bom tempo não voltar para casa por aquele caminho!
TENSO!
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