Todos os dias, as diferentes mídias despejam em nossas mentes enxurradas de informações sobre fortes chuvas que castigam a cidade e seus arredores. Por aqui, os corações vivem em sobressalto, estamos numa área com grande potencial para alagamentos. Aí, como não poderia deixar de ser, vêm à lembrança, as inúmeras vezes que fomos vítimas de grandes enchentes e, em especial, a primeira delas.
Novembro, 1961, o dia não lembro. Fomos em excursão ao Museu do Ipiranga com a escola. Um dia especial. Na volta para casa, o bonde Santo Amaro – Praça João Mendes parou inexplicavelmente na altura da bifurcação Adolfo Pinheiro com Vereador José Diniz (acho que não tinha esse nome, pois o José Diniz, Zé da farmácia, era vivo. Essa é outra história).
A tarde estava quente e ensolarada. Sem energia elétrica, o jeito era caminhar acompanhando os trilhos. Ao chegar à Parada Petrópolis, observei um pouco adiante, uma movimentação inusitada. Olhando barranco abaixo, não vi a vegetação das várzeas do Córrego do Cordeiro. Tudo estava alagado.
Não chovia e o imenso espelho d’água, que já atingia nossa casa, refletia o sol da tarde daquela primavera que já se despedia. Corri. Quando cheguei o quintal, o galinheiro e a horta estavam submersos. Meu pai salvava as galinhas e as lebres. Tirei o uniforme e ao descer a escada, deparei-me com aquela água barrenta e fétida que inundava a casa, atingindo o quarto degrau e ali à frente, cobrinhas, ratos e outros bichos nadavam num “salve-se quem puder!”. Medo. Nojo... Era mister ajudar no rescaldo de nossos pertences.
O Córrego do Cordeiro deságua no rio Pinheiros e tem sua nascente na região de Diadema, onde um temporal arrasara tudo. Sem solo poroso para absorver as águas e com acúmulo de lixo sob a ponte da linha do bonde, a água escoou pelo leito do córrego, o mesmo córrego, onde anos atrás eu brincava e pescava lambaris, e a enchente se fez, sob o sol daquela tarde.
Em 1966, outra, muito maior, aconteceu numa manhã de domingo, no mês de março. Eu morava então na Rua da Prata, no andar superior de um predinho de dois andares. Grávida, ilhada no minúsculo apartamento em companhia das vizinhas mais próximas, que com os filhos buscaram abrigo. A água escondeu as janelas das casas térreas. Faltaram dois degraus para entrar em meu apartamento.
Outras enchentes assolaram a Vila Carmen durante muitos anos e ainda hoje, apesar da canalização do Córrego do Cordeiro e da construção de galerias subterrâneas para escoamento das águas, ainda ocorrem alagamentos que prejudicam o trânsito e causam transtornos aos moradores e passantes da região.
Março já se vai e com esse friozinho agradável e bem vindo que nos acolhe nesta manhã vem a esperança de que mais uma vez o tempo das águas se despede e dará trégua aos nossos sobressaltados corações.
Dizemos adeus ao mês de março hoje, dia 31. Amanhã é o Dia da Mentira, 1° de abril, que na Idade Média era o Primeiro Dia do Ano. Com a mudança para primeiro de janeiro por decreto de Roma, os fiéis ao Primeor de Abril foram chamados de Bobos de Abril ('April Fools Day' em inglês). Daí o surgimento do
ResponderExcluirDia da Mentira. Mas vejo nisso uma ofensa ao mês da Paixão e da Páscoa, único mês do ano em que a Lua se põe sete dias antes da Páscoa logo atrás do Sol, no oeste, com os dois cornos para cima, parecendo uma tijela....anunciando para as famílias a chegada da data sagrada milenar...
Oi Lídia:
ResponderExcluirSeu texto me fez lembrar dos tempos em que eu morava no Ipiranga (década de 70). A Av. D.Pedro ficava totalmente congestionada, a Av. Tereza Cristina intransitável e na Vila Carioca, anexada ao Ipiranga, tinha gente que até barquinho guardava em casa por causa das enchentes.
Quarenta anos depois parece que a situação não mudou muito. Da última vez que choveu forte teve gente que ficou quase submersa, dentro do carro.
A prefeitura precisa tomar providências neste sentido, com urgência.
Abraços
Maria do Carmo