Minha amiga Cleide, já falecida, contava-nos esta passagem de sua vida e em certa ocasião, autorizou-me a participar de um concurso de crônicas com sua história e eu fui premiada.
Era uma excelente professora da Rede Pública Estadual, em São Paulo. Alegre, descontraída, boa amiga, lecionava para crianças que apresentavam necessidades especiais.Solteirona convicta, mais solteirona que convicta, dedicava-se com amor e carinho, aos filhos que Deus dera às outras e a um bando de cachorros e gatos que inexplicavelmente lhe deitavam à porta.
Por mais que desse trato à bola, não chegava à conclusão nenhuma sobre o porquê de tantos animais abandonados bem ali. Com tantas casas vizinhas, cheias de crianças sorridentes, que adoravam animaizinhos, era ali, e somente ali, que as pobres criaturinhas eram deixadas. Enfim, se vinham a ela, ela os acolhia e pronto.
Se não estava preparando as aulas, estava lavando, escovando ou levando para passear um ou outro animalzinho de seu numeroso acervo. Mas, como não só de cães e gatos vive o homem, e “a esperança é a última que morre”, a da nossa professorinha ainda estava bem viva e ela mantinha-se sempre alerta, à espera de que de uma hora para outra, seu príncipe chegasse, apesar das já transcorridas muitas primaveras.
Não era de hoje esse seu afã casadoiro.Datava da longínqua adolescência, quando então já recorria a simpatias para conseguir o tão sonhado matrimônio. Em certa ocasião, furtou uma imagem de Santo Antônio, da preciosa coleção de imagens barrocas da tia predileta, durante a mudança desta do Belém para a Vila Mariana.
- Santo Antônio... Santo Casamenteiro... Roubar sua imagem é fórmula infalível para arranjar marido. Infalível. Será?
Isso agora já fazia parte do passado. A imagem jazia esquecida, dentro de uma gaveta. O importante era cuidar com dedicação e carinho dos animais desamparados.
Um belo dia, sempre tem um belo dia, adoece-lhe a tia, aquela da mudança e da coleção de imagens e, a nossa dedicada professora transfere-se com cães e gatos para a residência da enferma a fim de prestar-lhe assistência. Conversa vai, conversa vem, arruma daqui, limpa dali, e eis que nossa personagem depara-se com a coleção de imagens da devota senhora. Pensando em agradá-la, puxa assunto com uma das peças nas mãos:
- Bonita esta imagem de São Francisco, padroeiro e protetor dos animais, não é tia?
- São Francisco?! Que nada, minha filha. Esse aí é Santo Antônio. São Francisco me sumiu naquela mudança que fizemos para a Vila Mariana. Você está lembrada? De repente, como se um raio a fulminasse, tudo ficou claro diante de seus olhos. São Francisco, coitado! Todo empoeirado, abandonado na gaveta, desprezado; aquela bicharada toda espalhada pela casa e casamento, nem em sonho...
Bonito conto, para quem gosta de ler - um passatempo e quem admira as letras, encanto.
ResponderExcluirMistérios do além...Hê-hê-hê
ResponderExcluirCamilo Roberto
Rio Preto (SP)
está explicado, o santo trocado!
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